quarta-feira, 30 de maio de 2007

E o Canil prossegue...




Eros e Psique

Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

(Fernando Pessoa)
A chocadeira não pára em Taquara-Poca

segunda-feira, 28 de maio de 2007


Versos íntimos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a ingratidão — esta pantera —
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
A.A.

domingo, 27 de maio de 2007

O Laço de Fita

Não sabes, criança? 'Stou louco de amores...
Prendi meus afetos, formosa Pepita.
Mas onde? No templo, no espaço, nas névoas?!
Não rias, prendi-me
Num laço de fita.
Na selva sombria de tuas madeixas,
Nos negros cabelos da moça bonita,
Fingindo a serpente qu'enlaça a folhagem,
Formoso enroscava-se
O laço de fita.
Meu ser, que voava nas luzes da festa,
Qual pássaro bravo, que os ares agita,
Eu vi de repente cativo, submisso
Rolar prisioneiro
Num laço de fita.
E agora enleada na tênue cadeia
Debalde minh'alma se embate, se irrita...
O braço, que rompe cadeias de ferro,
Não quebra teus elos,
Ó laço de fita!
Meu Deusl As falenas têm asas de opala,
Os astros se libram na plaga infinita.
Os anjos repousam nas penas brilhantes...
Mas tu... tens por asas
Um laço de fita.
Há pouco voavas na célere valsa,
Na valsa que anseia, que estua e palpita.
Por que é que tremeste? Não eram meus lábios...
Beijava-te apenas...
Teu laço de fita.
Mas ai! findo o baile, despindo os adornos
N'alcova onde a vela ciosa... crepita,
Talvez da cadeia libertes as tranças
Mas eu... f ico preso
No laço de fita.
Pois bem! Quando um dia na sombra do vale
Abrirem-me a cova... formosa Pepital
Ao menos arranca meus louros da fronte,
E dá-me por c'roa...
Teu laço de fita.
C.A
Canil para a família Airedale


Local do Canil


terça-feira, 22 de maio de 2007


AMIGOS VISITAM
TAQUARA-PÓCA








Adormecida
em memória de Vódinha, minha avó.
UMA NOITE, eu me lembro... Ela dormia
Numa rede encostada molemente...
Quase aberto o roupão... solto o cabelo
E o pé descalço do tapete rente. 'Stava aberta a janela. Um cheiro agreste
Exalavam as silvas da campina... E ao longe, num pedaço do horizonte,
Via-se a noite plácida e divina. De um jasmineiro os galhos encurvados,
Indiscretos entravam pela sala, e de leve oscilando ao tom das auras, iam na face trêmulos - beijá-la.Era um quadro celeste!...A cada afago mesmo em sonhos a moça estremecia...Quando ela serenava... a flor beijava-a...quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia...dir-se-ia que naquele doce instante brincavam duas cândidas crianças...A brisa, que agitava as folhas verdes, fazia-lhe ondear as negras tranças!E o ramo ora chegava ora afastava-se...mas quando a via despeitada a meio, p'ra não zangá-la... sacudia alegre uma chuva de pétalas no seio...
Eu, fitando esta cena, repetia naquela noite lânguida e sentida:'Ó flor! - tu és a virgem das campinas!'Virgem! - tu és a flor da minha vida!...'
C.A.

sábado, 19 de maio de 2007

são duas flôres nascidas
no mesmo ramo, quem sabe
no mesmo arrebol.Caule da jaqueira centenária.
Sarau em Taquara-Poca



O rádio Zenith de Taquara-Poca


Bromélia Palhaço
Laranjinhas
...noite magnífica

quinta-feira, 17 de maio de 2007

que meigo!
Marcelo et Victoire.
TAQUARA POCA
....e naquelas tardes mornas que só no nordeste acontecem ficava eu a sonhar com o lugar em que vivo agora. Taquara - Póca povoou minha infância, adolescência e vida adulta e ficará muito, muito depois de mim.
******
Francisco Marins, ao escrever esta literatura infanto-juvenil, cobre um determinado tipo de ruralidade, específico do minifúndio paulista da primeira metade do século XX. A Série Taquara-Póca, inicia-se em 1945, com o livro "Nas terras do Rei Café". Os livros seguintes são: “Os Segredos de Taquara-Póca”, “O Coleira Preta” e “Gafanhotos em Taquara-Póca”, totalizando quatro obras que seguem o mesmo enredo temático. É interessante analisar de que forma o escritor constrói a imagem da ruralidade, se esta se aproxima mais de uma visão romantizada ou real da vida no campo.
Pode-se dizer que Taquara-Póca representa uma pequena propriedade rural do interior paulista dos anos 1940-1950. A partir dela, Francisco Marins escreve sobre a vida rural brasileira e seus problemas. No entanto, quando mencionamos a questão da ruralidade, sabemos que se deve levar em consideração os diferentes universos rurais, as especificidades e dinâmicas do meio rural a ser estudado. Certamente a forma como se estabelecem as relações e as formas de vida numa pequena propriedade, não são as mesmas que se estabelecem em um latifúndio.
verde, verde e verdes
essa é do Havaí
o antúrio
Helicônias


quarta-feira, 16 de maio de 2007

lindo
periquitinho do amor

maio 2007


O que há em mim é sobretudo cansaço
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas
-Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada
-Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
Álvaro de Campos